Uma fala racista ou mais uma companheirada misteriosa?
Compartilhar
Lula, suas articulações e a blindagem que o mantém no poder
Por Andrey Neves
Antes de tudo sei que o assunto não está em alta, mas registro aqui para que não caia no esquecimento do leitor, porque a memória seletiva é justamente o que mantém velhas práticas impunes.
O Brasil voltou a se chocar com as palavras do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Durante uma fala pública, ao comentar a escolha de uma fotografia, Lula questionou: “Você acha bonito colocar uma cara sem dente e ainda negro?”. A frase, dita em alto e bom som, foi interpretada por muitos como abertamente racista — afinal, qual é o problema de um homem negro representar o país na capa de uma revista? Em um Brasil de maioria negra, a indignação se espalhou com a velocidade de um pavio aceso.
O deputado Hélio Negão protocolou ação contra Lula, e o caso foi encaminhado à Procuradoria-Geral da República (PGR). Hoje a instituição é comandada por Paulo Gonet Branco, nomeado recentemente pelo próprio presidente. Gonet, vale lembrar, já se posicionou a favor da inelegibilidade de Jair Bolsonaro no TSE, gesto que foi visto como um sinal de alinhamento político com Lula. Além disso, possui laços próximos ao ministro Gilmar Mendes, com quem já dividiu escritório de advocacia, fator que ajudou a consolidar sua escolha.
Caso o episódio seja considerado crime de racismo, o processo poderá ser levado ao Supremo Tribunal Federal (STF). E aí está o ponto: ao longo de seus mandatos, Lula já indicou uma dezena de ministros à mais alta corte do país.
Os indicados por Lula ao STF
-
Carlos Ayres Britto (2003) – Jurista de prestígio, presidiu o STF, aposentado em 2012.
-
Joaquim Barbosa (2003) – Primeiro ministro negro da corte, relator do Mensalão, aposentado em 2014.
-
Cezar Peluso (2003) – Atuou até 2012, sem escândalos públicos.
-
Eros Grau (2004) – Aposentado em 2010.
-
Ricardo Lewandowski (2006) – Atuou até 2023, figura polêmica em votações, mas sem condenações.
-
Cármen Lúcia (2006) – Ainda em atividade, conhecida por postura firme.
-
Dias Toffoli (2009) – Nome contestado pela trajetória política anterior no PT, mas ocupa cadeira até hoje.
-
Cristiano Zanin (2023) – Advogado pessoal de Lula, aprovado para o STF em 2023.
-
Flávio Dino (2024) – Ex-ministro da Justiça de Lula, atual ministro da Suprema Corte.
Nenhum desses ministros tem condenações criminais, mas todos foram nomeados por Lula — o que gera debate sobre a imparcialidade em processos que envolvam diretamente o presidente.
O caso Alexandre de Moraes
Embora não seja indicado por Lula, e sim por Michel Temer (2017), Alexandre de Moraes também entra na equação. Em falas públicas anteriores, ele não poupou críticas ao PT, classificando o partido como “corrupto” e “ladrão”, acusando-o de desviar bilhões que poderiam ter sido aplicados em segurança e presídios, em vez de financiar obras em Cuba.
Hoje, no entanto, Moraes é visto como atuando em sintonia com Lula, sobretudo após as eleições de 2022 e durante os primeiros anos do atual mandato. Uma mudança de rota que intriga, mas que ao mesmo tempo consolida a percepção de blindagem política em torno do presidente.
Conclusão
Diante desse cenário, resta a pergunta: será que a fala de Lula terá algum desdobramento jurídico real, ou será apenas mais um caso que morre nas gavetas da Justiça? Ao que tudo indica, a memória curta da esquerda e a rede de aliados estratégicos garantem que, mesmo quando um crime parece evidente, nada de concreto acontece.
No fim das contas, a fala racista vira apenas mais um capítulo da velha companheirada misteriosa que sustenta o poder no Brasil.